20-09-2024 14:06
A infeção pelo VIH afeta de forma severa a saúde física dos doentes, e tem impacto relevante na vida emocional, social e sexual destas pessoas. A revisão da literatura revela que os fatores biopsicossociais associados a uma melhor ou pior Qualidade de Vida das pessoas com VIH/SIDA podem ser individuais, culturais, sociais e emocionais, relacionados com o impacto do diagnóstico e do tratamento e a convivência quotidiana com a doença crónica (Reis, Santos, Dantas & Gir, 2011).
A infeção por VIH/SIDA representa para quem a contraiu uma angústia constante. Da intervenção psicológica realizada com as pessoas portadoras do vírus ou doentes de SIDA no CAPS VIH/SIDA do GAF - Gabinete de Atendimento à Família ao longo de décadas, destacam-se aspetos de vida que acarretam sofrimento e instabilidade emocional (corroborados pelo estado da arte):
1. Adesão à terapêutica e o sigilo
A SIDA, a palavra, a noção, a situação social, a doença, são um elemento integrante, na nossa sociedade. O seu impacto é amplo. Se por um lado assusta, todos hoje sabem que a SIDA, apesar dos enormes progressos conseguidos no seu conhecimento, continua a ser um desafio para a ciência e para a investigação.
O conhecimento da infeção pelo VIH desencadeia, na pessoa portadora, uma maior preocupação com a saúde no geral, devido ao impacto do diagnóstico, à preocupação relativa ao adoecer e à necessidade de adaptação a uma nova realidade (Reis, Santos, Dantas & Gir, 2011).
O VIH/SIDA foi e continua a ser mais do que um problema de saúde! Trouxe ao longo de décadas de contacto com esta infeção condições na sociedade para se validarem valores e direitos outrora esquecidos, dos quais foram destacados: “O direito do doente ao segredo profissional por parte dos médicos; (…)” (Gracia, 1991, p.46).
É comum um/a portador/a do VIH/SIDA manter sigilo sobre o diagnóstico. Numa investigação com pessoas com diagnóstico recente, um número significativo dessas pessoas percecionaram a infeção como a morte física e social, decorrendo daí um enfrentamento pela negação e/ou pelo segredo sobre o seu estado serológico de infetada/o. Muitas pessoas VIH+ ou doentes de SIDA optam por restringir ao máximo o número de pessoas que conhecem seu diagnóstico, adotando uma "vida em duplicidade” (Reis, Santos, Dantas & Gir, 2011).
2. Medo da morte
Quando se pensa no impacto da infeção por VIH/SIDA são duas as palavras que surgem: amplo e diversificado! Foi e continua a ser um desafio para a ciência e para a investigação, mas
também para cada um das/os cidadãs/ãos infetadas/os e não infetadas/os à escala mundial. Provocou muito medo (era grave e mortal!), e ainda hoje provoca, apesar do conhecimento sobre o VIH/SIDA ser profundo e abrangente e ser considerada uma doença crónica tratável com grande taxa de sucesso.
3. Medo da discriminação e do estigma dentro e fora da família
Muitas pessoas que vivem com VIH/SIDA sentem-se obrigadas a esconder, fingir e mentir relativamente a aspetos importantes das suas vida e das relações humanas (sexo, morte, preconceito), pois viver com o VIH/SIDA representa enfrentar o estigma de ser visto como portador de "uma doença sem cura" e, ainda, como um potencial transmissor de uma "sentença de morte" (Reis, Santos, Dantas & Gir, 2011).
A serodiscordância (um elemento da relação é portador/a do VIH e a/o outra/o não) é uma realidade para muitos dos casais na atualidade, embora exista o preconceito e as dificuldades associadas, inclusive no relacionamento sexual devido ao medo da transmissão do VIH à/ao parceira/o e o recurso ao sexo seguro, constata-se que os/as parceiras/os seronegativos são fontes de apoio emocional, apoiando na adesão ao tratamento medicamentoso e na ligação à saúde (Reis, Santos, Dantas & Gir, 2011).
A revisão da literatura sublinha que o apoio social se associa a um menor sofrimento psicológico, a menos sintomas psiquiátricos, bem como a baixos índices de ansiedade e depressão e a uma maior Qualidade de Vida. Assim sendo, a existência de apoio social é um fator atenuador do impacto negativo da seropositividade na vida das pessoas infetadas pelo VIH, considerando-se um recurso externo facilitador da adaptação ao processo da doença (Reis, Santos, Dantas & Gir, 2011).
4. Medo do envolvimento sexual e do risco de transmissão do VIH
A infeção por VIH/SIDA conjuga numa mesma fonte dois elementos antagónicos, a noção de morte e os valores do prazer e mesmo do amor. Logo, é irrefutável que a sexualidade é um dos aspetos de vida mais comprometidos pelo impacto da seroporitividade ao VIH e das consequências emocionais e sociais a ela associadas (Reis, Santos, Dantas & Gir, 2011).
Como resultado do diagnóstico da infeção pelo VIH pode surgir perda da libido e cessação ou redução da atividade sexual, bem como o medo de transmissão à/ao parceira/o sentido pelas pessoas portadoras do VIH/SIDA e a dificuldade de falar sobre sexualidade com os profissionais de saúde. Por outro lado, intensifica-se o medo de ser abandonado e rejeitado pela/o parceiro/a, já que a necessidade de manter um relacionamento afetivo-sexual é um aspeto central na vida das pessoas portadoras do VIH/SIDA, contribuindo para a melhoria a sua Qualidade de Vida (Reis, Santos, Dantas & Gir, 2011).
Para aprofundar a temática
Garcia, J. T. (1991). O impacto da SIDA em Portugal. Ata Médica Portuguesa, 4 Suple. 1 (I). p. 44-46
Greco, D. B. (2008). A epidemia da Aids: impacto social, científico, econômico e perspectivas. Estudos Avançados, Vol. 22 , no. 64
Reis, R.K., Santos, C.B., Dantas, R.A.S. & Gir, E. (2011). Qualidade de vida, aspectos sociodemográficos e de sexualidade de pessoas vivendo com HIV/AIDS. Enfermagem, 20 (3)